sexta-feira, 23 de março de 2012

O ambulante

Foto: Inferno de Bosch


Venham! Acheguem-se!

Se são pragas que quereis
Vierdes à tenda certa
Se não, então espereis:
Sempre tenho a coisa certa!

Mas sim, vejo que quereis as pragas...
Todas elas eu ofereço,
Sempre por um justo preço,

Pecados capitais instituídos
E tantos mais,
Refúgios dos empossuídos,
Estas almas em desgaste e humilhação
Repletas de ais, e
Ingenuidade, muita
Ademais:
Maldade, gratuita

E eis os belos produtos...!

Soberba para os de grande ego
Cegos e ciosos de seus sonhos solitários
Aos que correm solo
Aos que negam colo
Aos apartidários
Aos caolhos, aos piolhos, aos malditos
E aos ácaros...
…E aos Ícaros!

Luxúria para os necessitados
Que às lamúrias se entregam,
Preocupados com seus pintos
E bocetinhas,
E jorram, com escassez,
Esperma e líquidos vencidos,
Por seus canais entupidos,
Masoquisticamente corrompidos, estúpidos,
Fingindo esperteza, em púpitos de imbeleza

Avareza para os ricos,
Os donos dos circos,
Corvos da ignorância,
Os banqueiros, e o estofo da classe burguesa, estes patifes
Enfiados em ternos de grife,
Com bonitas esferas luzidias sobre a mesa de centro
(Dentro: magma)
Entre tantas outras mesquinharias
Que se avaliam em milhões de dracmas
E que por fim perecem,
E caem
Numa piscina cheia por todo lado de lodo e merda
Insanitarizada

E então, como se nada:

Gula, o prazer em consumir
As coxas de um porco,
Engolir,
Através do tubo gutural,
As partes mais ímpias de qualquer animal de patas fendidas, ou
Sem vida. É o pecado do homem que se satisfaz ingerindo sebo,
Impuro,
Que sai à bunda de um porco morto em um monturo com uma maça e ora com uma maçã enfiada na boca,
Causando doença mórbida,
Proveniente da ânsia por movimentar os dentes,
Regar o estômago com cerveja, e onças e onças de carne em decomposição…

E a Ira, meu melhor produto
O menos fajuto
O mais inculto,
O mais terrível,
O mais original
Pois, por este, mata-se requintadamente ao seu igual
Sem nenhum motivo claro
As facas e as armas à mesa, legitimam a frieza,
E
Os demônios
Que brotam na escuridão,
Aplaudem a astúcia do criminoso
E o sangue e as tripas estendidas ao chão
Que sacodem de um jeito escroto...

Inveja,
Esta naja, a observar uma cereja no bolo alheio, que algum sacana surrupiou antes
É outro dos meus bons produtos,
A inveja pode ganir
Como um cão
Faminto por carniça,
E
Procurando companhia,
Para esta noite
Apenas para traí-la
Bendita a cobiça!
Tão logo a oportunidade desponte, e lhe sugira um belo golpe de punhal…

e
Finalmente,
Preguiça,
Este mal que atinge a tantos espectadores de missas,
A abraçar num urso-abraço o seu vitmado,
Devastadora
Via enfado,
Do gozo de viver,
Cabível
Apenas
Aos que não podem ver,
Nas coisas um prazer próprio,
Que fazem nela jazigo,
Ópio antiperigo,
E buscam suposta calma,
Largam os poemas, e a própria alma
E assim, vencidos e esmaecidos permanecem
Como mortos em vida

*

Pois bem,
Estais convencidos
Da utilidade de meus produtos
Meus comensais queridos...?
Eu juro: não são fajutos…
E também:
Não estão vencidos

Quereis pagar à crédito?
Oh sim, meus súditos,
Eis algo inédito:
Levando o Ócio junto,
E também o Tédio Nédio,
Faremos este acordo:
Não cobro juros


Joice Furtado e Cavi Pessoa

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